Paulo Emanuel Lopes
Adital
Para o professor de Direito Penal Raul Nepomuceno, da Universidade Federal do Ceará (UFC), legalizar as drogas no Brasil é uma opção arriscada, haja vista as consequências que a facilidade de acesso poderia acarretar. "Há um dilema para nós do Direito Penal: até quando a pessoa, ao consumir drogas, não acarreta danos à sociedade?”
Apesar de vista como "progressista”, Nepomuceno critica a atual legislação brasileira, de 2006, que não teria alcançado os objetivos propostos. "Essa legislação aumentou a repressão contra quem é acusado de tráfico, o que é uma incoerência, pois como eu vou diminuir a repressão ao usuário se isso vai aumentar a demanda pelas drogas?”
Para Nepomuceno, entretanto, a legalização da maconha no Brasil é uma opção a ser considerada pela classe política brasileira. "Para saber se [a legalização] vai aumentar ou não o consumo de maconha só há duas possibilidades: ou estudamos o caso de países que já legalizaram, analisando se as condições de lá são parecidas com as nossas, ou testamos aqui no Brasil”.
Adital - Observamos que a atual legislação brasileira de combate às drogas [nº 11.343, de 23 de agosto de 2006] procurou descriminalizar o usuário, mas, pelos dados mais recentes, observamos que os encarceramentos no Brasil por conta das drogas vêm aumentando. Então, o que está errado, a lei ou quem está aplicando essa lei?
Raul Nepumoceno - Parece-me que a aplicação [da lei] tem uma responsabilidade maior por esse aumento do que a Lei em si... O que acontece é que muitos usuários acabam enquadrados como traficantes. São encontrados com uma pequena quantidade, mas, pelo fato de terem compartilhado a droga com amigos, acabam enquadrados como traficantes. Não há em nossa legislação um critério objetivo para se diferenciar o usuário do traficante. Parece que tem havido um certo abuso na interpretação dessa Lei.
Adital - Para alguns defensores da legalização da maconha no Brasil, o Estado não deveria interferir na vontade pessoal dos indivíduos. Como o Direito entende esse argumento?
RN - Isso que você aponta é um dos princípios básicos do Direito, o da intervenção mínima. Segundo esse princípio, o Direito Penal só deve agir para coibir ações que causam prejuízo aos outros, não a si próprio. É por isso que a autolesão, quando você se machuca, se corta, não se configura crime. Se a pessoa tem algum problema pessoal deve ser cuidada no âmbito da família, privado, o Estado não vai puni-lo. Você vê, o álcool tem efeitos maléficos, o tabaco possui efeitos maléficos, mas cabe à pessoa decidir se deseja consumi-los ou não.
No caso de drogas mais pesadas, como a cocaína ou o crack, o consumo dessas substâncias pode transformar a personalidade da pessoa... De repente, ela pode se envolver em determinadas condutas, como furtar para sustentar seu vício. Ou seja, há um dilema para nós do Direito Penal: até quando a pessoa, ao consumir drogas, não acarreta danos à sociedade?
Atualmente, esse dilema, como todo mundo sabe, está muito bem resolvido. O Estado brasileiro opta por proibir, reprimir, apesar das mudanças, observadas nos últimos anos, de diminuição da repressão ao usuário. Por outro lado, essa legislação aumentou a repressão contra quem é acusado de tráfico, o que é uma incoerência, pois como eu vou diminuir a repressão ao usuário se isso vai aumentar a demanda pelas drogas? Pelas leis básicas da economia, enquanto houver demanda haverá oferta.
Adital - Em contraposição, há o argumento das pessoas contrárias à legalização da maconha, afirmando que a não repressão irá estimular o aumento do consumo. O Direito Penal tem a capacidade de mudar a cultura das pessoas?
RN - Nesse caso temos que partir para a experiência de outros países. Eu não tenho dados exatos para lhe dizer, mas há relatos, por exemplo, no Uruguai, de que houve um aumento inicial no consumo [de maconha, recentemente legalizada nesse país], mas, depois esse aumento, se estabilizou, não é algo que vem crescendo. Reforço mais uma vez que não tenho dados concretos para lhe apresentar, essa informação eu acompanhei nos debates de que participei em assembleias públicas no Congresso Nacional.
Para saber se vai aumentar ou não o consumo de maconha só há duas possibilidades: ou estudamos o caso de países que já legalizaram, analisando se as condições de lá são parecidas com as nossas, ou testamos aqui no Brasil. Na minha opinião, a tentativa é uma alternativa. Não todas as drogas, mas quanto à maconha, por exemplo, fazer uma legislação em que experimentamos por cinco anos e observar com a coisa funciona. Seria um meio-termo entre continuar a repressão como está ou abolir de uma vez a legislação penal contra as drogas.
Movimentos em prol da legalização da argumentam que criminalização favorece o tráfico. Foto: Reprodução. |
Apesar de vista como "progressista”, Nepomuceno critica a atual legislação brasileira, de 2006, que não teria alcançado os objetivos propostos. "Essa legislação aumentou a repressão contra quem é acusado de tráfico, o que é uma incoerência, pois como eu vou diminuir a repressão ao usuário se isso vai aumentar a demanda pelas drogas?”
Para Nepomuceno, entretanto, a legalização da maconha no Brasil é uma opção a ser considerada pela classe política brasileira. "Para saber se [a legalização] vai aumentar ou não o consumo de maconha só há duas possibilidades: ou estudamos o caso de países que já legalizaram, analisando se as condições de lá são parecidas com as nossas, ou testamos aqui no Brasil”.
Adital - Observamos que a atual legislação brasileira de combate às drogas [nº 11.343, de 23 de agosto de 2006] procurou descriminalizar o usuário, mas, pelos dados mais recentes, observamos que os encarceramentos no Brasil por conta das drogas vêm aumentando. Então, o que está errado, a lei ou quem está aplicando essa lei?
Raul Nepumoceno - Parece-me que a aplicação [da lei] tem uma responsabilidade maior por esse aumento do que a Lei em si... O que acontece é que muitos usuários acabam enquadrados como traficantes. São encontrados com uma pequena quantidade, mas, pelo fato de terem compartilhado a droga com amigos, acabam enquadrados como traficantes. Não há em nossa legislação um critério objetivo para se diferenciar o usuário do traficante. Parece que tem havido um certo abuso na interpretação dessa Lei.
Adital - Para alguns defensores da legalização da maconha no Brasil, o Estado não deveria interferir na vontade pessoal dos indivíduos. Como o Direito entende esse argumento?
RN - Isso que você aponta é um dos princípios básicos do Direito, o da intervenção mínima. Segundo esse princípio, o Direito Penal só deve agir para coibir ações que causam prejuízo aos outros, não a si próprio. É por isso que a autolesão, quando você se machuca, se corta, não se configura crime. Se a pessoa tem algum problema pessoal deve ser cuidada no âmbito da família, privado, o Estado não vai puni-lo. Você vê, o álcool tem efeitos maléficos, o tabaco possui efeitos maléficos, mas cabe à pessoa decidir se deseja consumi-los ou não.
O professor de Direito Penal Raul Nepomuceno questiona até que ponto o consumidor não acarreta danos à sociedade. Foto: Blog da Casa - UFC. |
No caso de drogas mais pesadas, como a cocaína ou o crack, o consumo dessas substâncias pode transformar a personalidade da pessoa... De repente, ela pode se envolver em determinadas condutas, como furtar para sustentar seu vício. Ou seja, há um dilema para nós do Direito Penal: até quando a pessoa, ao consumir drogas, não acarreta danos à sociedade?
Atualmente, esse dilema, como todo mundo sabe, está muito bem resolvido. O Estado brasileiro opta por proibir, reprimir, apesar das mudanças, observadas nos últimos anos, de diminuição da repressão ao usuário. Por outro lado, essa legislação aumentou a repressão contra quem é acusado de tráfico, o que é uma incoerência, pois como eu vou diminuir a repressão ao usuário se isso vai aumentar a demanda pelas drogas? Pelas leis básicas da economia, enquanto houver demanda haverá oferta.
Ativistas contra as drogas defendem que legalização da maconha ampliará violência. Foto: Reprodução. |
Adital - Em contraposição, há o argumento das pessoas contrárias à legalização da maconha, afirmando que a não repressão irá estimular o aumento do consumo. O Direito Penal tem a capacidade de mudar a cultura das pessoas?
RN - Nesse caso temos que partir para a experiência de outros países. Eu não tenho dados exatos para lhe dizer, mas há relatos, por exemplo, no Uruguai, de que houve um aumento inicial no consumo [de maconha, recentemente legalizada nesse país], mas, depois esse aumento, se estabilizou, não é algo que vem crescendo. Reforço mais uma vez que não tenho dados concretos para lhe apresentar, essa informação eu acompanhei nos debates de que participei em assembleias públicas no Congresso Nacional.
Para saber se vai aumentar ou não o consumo de maconha só há duas possibilidades: ou estudamos o caso de países que já legalizaram, analisando se as condições de lá são parecidas com as nossas, ou testamos aqui no Brasil. Na minha opinião, a tentativa é uma alternativa. Não todas as drogas, mas quanto à maconha, por exemplo, fazer uma legislação em que experimentamos por cinco anos e observar com a coisa funciona. Seria um meio-termo entre continuar a repressão como está ou abolir de uma vez a legislação penal contra as drogas.
Paulo Emanuel Lopes
Publicitário e estudante de jornalismo. Colabora com ADITAL.
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