sexta-feira, 6 de março de 2015

Drogas: legalização da maconha pode ser uma opção a ser testada no Brasil

Paulo Emanuel Lopes
Adital
Para o professor de Direito Penal Raul Nepomuceno, da Universidade Federal do Ceará (UFC), legalizar as drogas no Brasil é uma opção arriscada, haja vista as consequências que a facilidade de acesso poderia acarretar. "Há um dilema para nós do Direito Penal: até quando a pessoa, ao consumir drogas, não acarreta danos à sociedade?”


Movimentos em prol da legalização da argumentam que criminalização favorece o tráfico. Foto: Reprodução.


Apesar de vista como "progressista”, Nepomuceno critica a atual legislação brasileira, de 2006, que não teria alcançado os objetivos propostos. "Essa legislação aumentou a repressão contra quem é acusado de tráfico, o que é uma incoerência, pois como eu vou diminuir a repressão ao usuário se isso vai aumentar a demanda pelas drogas?”

Para Nepomuceno, entretanto, a legalização da maconha no Brasil é uma opção a ser considerada pela classe política brasileira. "Para saber se [a legalização] vai aumentar ou não o consumo de maconha só há duas possibilidades: ou estudamos o caso de países que já legalizaram, analisando se as condições de lá são parecidas com as nossas, ou testamos aqui no Brasil”.

Adital - Observamos que a atual legislação brasileira de combate às drogas [nº 11.343, de 23 de agosto de 2006] procurou descriminalizar o usuário, mas, pelos dados mais recentes, observamos que os encarceramentos no Brasil por conta das drogas vêm aumentando. Então, o que está errado, a lei ou quem está aplicando essa lei?

Raul Nepumoceno - Parece-me que a aplicação [da lei] tem uma responsabilidade maior por esse aumento do que a Lei em si... O que acontece é que muitos usuários acabam enquadrados como traficantes. São encontrados com uma pequena quantidade, mas, pelo fato de terem compartilhado a droga com amigos, acabam enquadrados como traficantes. Não há em nossa legislação um critério objetivo para se diferenciar o usuário do traficante. Parece que tem havido um certo abuso na interpretação dessa Lei.


Adital - Para alguns defensores da legalização da maconha no Brasil, o Estado não deveria interferir na vontade pessoal dos indivíduos. Como o Direito entende esse argumento?

RN - Isso que você aponta é um dos princípios básicos do Direito, o da intervenção mínima. Segundo esse princípio, o Direito Penal só deve agir para coibir ações que causam prejuízo aos outros, não a si próprio. É por isso que a autolesão, quando você se machuca, se corta, não se configura crime. Se a pessoa tem algum problema pessoal deve ser cuidada no âmbito da família, privado, o Estado não vai puni-lo. Você vê, o álcool tem efeitos maléficos, o tabaco possui efeitos maléficos, mas cabe à pessoa decidir se deseja consumi-los ou não.


O professor de Direito Penal Raul Nepomuceno questiona até que ponto o consumidor não acarreta danos à sociedade. Foto: Blog da Casa - UFC.


No caso de drogas mais pesadas, como a cocaína ou o crack, o consumo dessas substâncias pode transformar a personalidade da pessoa... De repente, ela pode se envolver em determinadas condutas, como furtar para sustentar seu vício. Ou seja, há um dilema para nós do Direito Penal: até quando a pessoa, ao consumir drogas, não acarreta danos à sociedade?

Atualmente, esse dilema, como todo mundo sabe, está muito bem resolvido. O Estado brasileiro opta por proibir, reprimir, apesar das mudanças, observadas nos últimos anos, de diminuição da repressão ao usuário. Por outro lado, essa legislação aumentou a repressão contra quem é acusado de tráfico, o que é uma incoerência, pois como eu vou diminuir a repressão ao usuário se isso vai aumentar a demanda pelas drogas? Pelas leis básicas da economia, enquanto houver demanda haverá oferta.


Ativistas contra as drogas defendem que legalização da maconha ampliará violência. Foto: Reprodução.


Adital - Em contraposição, há o argumento das pessoas contrárias à legalização da maconha, afirmando que a não repressão irá estimular o aumento do consumo. O Direito Penal tem a capacidade de mudar a cultura das pessoas?

RN - Nesse caso temos que partir para a experiência de outros países. Eu não tenho dados exatos para lhe dizer, mas há relatos, por exemplo, no Uruguai, de que houve um aumento inicial no consumo [de maconha, recentemente legalizada nesse país], mas, depois esse aumento, se estabilizou, não é algo que vem crescendo. Reforço mais uma vez que não tenho dados concretos para lhe apresentar, essa informação eu acompanhei nos debates de que participei em assembleias públicas no Congresso Nacional.
Para saber se vai aumentar ou não o consumo de maconha só há duas possibilidades: ou estudamos o caso de países que já legalizaram, analisando se as condições de lá são parecidas com as nossas, ou testamos aqui no Brasil. Na minha opinião, a tentativa é uma alternativa. Não todas as drogas, mas quanto à maconha, por exemplo, fazer uma legislação em que experimentamos por cinco anos e observar com a coisa funciona. Seria um meio-termo entre continuar a repressão como está ou abolir de uma vez a legislação penal contra as drogas.


Paulo Emanuel Lopes

Publicitário e estudante de jornalismo. Colabora com ADITAL.
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Política de repressão às drogas: eficiência ou fracasso?

Paulo Emanuel Lopes
Adital

Neste início de 2015, a prisão do brasileiro André da Cruz Teixeira Leite, no Estado do Rio de Janeiro, reacendeu a discussão em torno da política de repressão às drogas no Brasil. O músico da banda Cone Drew Diretoria mantinha em sua residência quatro pés de maconha, afirmando serem destinados ao consumo pessoal.

Repressão às drogas traz mais desvantagens do que vantagens? Foto: mercadopopular.org


Um dos principais argumentos de quem se coloca contra a legalização da maconha é que sua regulamentação poderia incentivar o aumento no consumo. Já as pessoas favoráveis a uma legislação mais branda argumentam que, além da proibição não impedir o acesso à droga, a repressão seria responsável por desvantagens à sociedade superiores às vantagens.

Repressão: a voz do usuário

Laerte Duarte é músico e designer gráfico. Pai de dois filhos, Duarte conseguiu uma boa colocação profissional. Sua vida, entretanto, poderia ter tomado um rumo bem diferente quando, aos 18 anos, sofreu agressões por quem é financiado para lhe proteger: o Estado.

"Em 1980, portar [maconha] ainda era crime e acharam um baseado comigo. Por conta disso, fui preso, além de sofrer maus tratos. Bateram em mim para que eu dissesse onde tinha comprado. Ficaria ainda mais complicado entregar o traficante, porque poderia me acarretaria futuras retaliações”.

Duarte foi obrigado a sair de sua cidade natal, Fortaleza, Estado do Ceará, por conta das consequências que portar um cigarro de maconha lhe imputou. "Tinha acabado de completar 18 anos. A prisão me gerou muitas complicações, como meu nome ser citado nas rádios. Tive que viajar após o fato para o Rio de Janeiro, perdi o vestibular e, por consequência, a entrada na universidade”.


Manifestantes protestam contra internação compulsória dos usuários de drogas. Foto: Reprodução.


Saldo da política de drogas no Brasil

A aprovação, em 2006, da atual Lei de combate às drogas no Brasil buscou reduzir a coerção ao usuário. Entretanto, passados oito anos da nova legislação, o encarceramento motivado pelas drogas no Brasil só fez aumentar.

Segundo o documento "Agenda Nacional pelo Desencarceramento”, divulgado pela Pastoral Carcerária brasileira, entre 2005 e 2011 o número de pessoas presas por tráfico no País saltou de 31.520 para 115.287. "Nada disso resultou em melhorias na segurança pública e na vida do povo em geral. Além disso, o proibicionismo também não diminuiu o comércio de drogas e não abriu o necessário debate sobre a classificação e definição de quais substâncias devem ou não devem ser consideradas ilícitas”, afirma em entrevista à Adital Marcelo Naves, vice-coordenador da Pastoral Carcerária na Arquidiocese de São Paulo.

Legalização da maconha ainda distante no Brasil

Para Rossana Kopf, articuladora do movimento "Brasil sem drogas”, o país não deveria enveredar pelos caminhos da legalização da maconha haja vista a fragilidade institucional das políticas públicas nacionais.

"Nós (brasileiros) somos o primeiro país no mundo no consumo do crack e o segundo no de cocaína, não precisamos de uma terceira droga [a maconha] em nossas estatísticas. Você vê, os perigos para a saúde com a banalização da maconha são enormes, como a esquizofrenia. [Nós do movimento] Não somos proibicionistas, fomos inclusive a favor da legalização do canabinol [medicamento à base de cannabis sativa]. Mas somos completamente contra o uso recreativo [da maconha], pois, em nosso país, as regras são muito frouxas, sem controle, e não queremos que crianças tenham acesso a essa droga.”

Para Laerte Duarte, que conheceu de perto a realidade da repressão, a política atual nunca trará os resultados desejados. Ao invés de tomar a decisão pelo usuário, o Estado deveria atuar com mais informação, transferindo aos cidadãos a responsabilidade por seus próprios atos.


Laerte Duarte lamenta repressão que sofreu na adolescência por ser usuário de maconha. Foto: Arquivo pessoal.


"Comprar nunca foi empecilho. A única coisa que me fez parar de fumar maconha foi minha própria vontade. Nunca me tornei marginal por conta disso... O Estado deveria cuidar mesmo era da saúde pública e da educação. [A regulamentação] só traria benefícios para todos, inclusive para quem gosta de arrecadar impostos. A Souza Cruz, inclusive, já tem patenteada a marca ‘Marley’ para quando chegar a hora de lançar o seu baseado industrial.”

Para Rossana, entretanto, tais argumentos não são suficientes. "A questão não é legalizar, liberar, mas sim trabalhar a prevenção e conscientização das pessoas. De que adianta o Estado legalizar se não atua na prevenção? Temos [sociedade e Estado] que agir nas escolas, indústrias, famílias... O jovem inicia no álcool, e a curiosidade natural o leva à maconha, à cocaína. Sem falar no perigo das novas drogas que estão surgindo”.

Repressão: uma política seletiva

Marcelo Naves, da Pastoral Carcerária: criminalização das drogas só vale para pobres e moradores da periferia. Foto: Pastoral Carcerária.


Conforme afirma o padre Valdir João Silveira, coordenador nacional da Pastoral Carcerária, em recente entrevista ao jornal "El País”, [http://brasil.elpais.com/brasil/2015/01/26/politica/1422280432_427247.html]"quem define quem é usuário e quem é traficante é a polícia, que acaba tomando essa decisão com base no perfil do suspeito: se foi preso na favela, é traficante”.

Para a Pastoral Carcerária, a guerra contra as drogas é um "slogan” para justificar o aumento da repressão e do controle das comunidades periféricas no Brasil. "A Pastoral Carcerária, já há muito tempo, denuncia que o sistema penal e punitivo brasileiro é extremamente seletivo. Apresentamos essa posição com propostas de políticas públicas na área de segurança pública e direitos humanos na ‘Agenda Nacional de Desencarceramento’. Sempre que se discute o endurecimento das penas, sabemos que redundará na criminalização das pessoas pobres e moradoras das periferias”, explica Marcelo Naves.


Paulo Emanuel Lopes

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Segurança alimentar: América Latina alcança meta mundial de redução da fome, mas prossegue com desigualdades

Por Marcela Belchior Adital
Relatório publicado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO, na sigla em inglês) aponta a América Latina como a primeira e única região do mundo que alcançou, de maneira antecipada, a meta dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). Grande parte dos países da região cumpriu o fim de redução da fome, estabelecido pela Cúpula Mundial da Alimentação (CMA). Segundo a organização, nenhuma outra parte do globo está sequer próxima da conquista.

Desde 1990, países trabalham pelo cumprimento da meta. Foto: Reprodução.

A meta estipulada pelos ODM é de, no período de 1990 a 2015, reduzir à metade a prevalência de pessoas que sofrem da fome no mundo. Até 2014, no entanto, a América Latina já conseguiu reduzir esta proporção de 14,4% para 5,1%, superando a meta. Nesse mesmo sentido, a CMA propôs que, no mesmo período de tempo, fosse reduzido à metade o número absoluto de pessoas com fome. Também aí os países latino-americanos foram além, diminuindo esse índice de 60,3 milhões de pessoas subalimentadas, em 1990, para 29,5 milhões, no ano passado.
Na comparação do avanço relativo dos países da região, é possível observar que nove países alcançaram 100% do objetivo de redução da subalimentação. São eles Argentina, Brasil, Chile, México, Uruguai, Venezuela, Nicarágua, Panamá e Peru. Os seis primeiros, inclusive, chegaram a uma redução da prevalência da fome abaixo dos 5% da população, percentagem considerada muito além do esperado.

Nos casos da Nicarágua e do Peru, recebem destaque especial na comparação com as circunstâncias de partida dos países. Em 1990, o primeiro país centro-americano registrava 54,4% da população sofrendo de fome. Em 2014, esse índice foi reduzido para 16,8%. Já na nação sul-americana a diminuição nos últimos 24 anos foi de 34,4% para apenas 8,7%.

As nações que ainda não alcançaram a meta estão muito próximas de realizá-la em 2015. A Bolívia já avançou em 97,3% do objetivo, enquanto Honduras caminhou 94,7% e a Colômbia marca o índice de 94,4% de cumprimento. Outros quatro países tiveram avanços limitados e se considera improvável que alcancem o objetivo dentro do prazo estabelecido: Paraguai, com 87,15%; Equador, com 84,5%; El Salvador, com 33,3%; e Guatemala, com apenas 8% de avanço.

Chama a atenção o caso da Costa Rica, único país da região que não apenas não reduziu como aumentou os índices de fome entre a população. A percentagem de costarriquenhos subalimentados foi incrementada em 0,7% durante os últimos 24 anos, passando de 5,2% para 5,9%.


América Latina tem grande produção alimentícia, mas distribuição de riquezas é desigual. Foto: Reprodução.


Para a FAO, o avanço no enfrentamento da fome na região se deve ao compromisso político dos governos, à mobilização de toda a sociedade, ao reforço de sistemas de proteção social, com medidas para apoiar a produção (especialmente a agricultura familiar), além do desenvolvimento e fortalecimento dos marcos legais que permitem consolidar as conquistas e dotar recursos orçamentários à causa.

Esse panorama positivo e esperançoso para a suplantação de um dos mais graves problemas da humanidade, porém, continua marcado por desigualdades. Ainda que haja avanços nas políticas sociais e econômicas, a fome persiste na região. Segundo o diretor-geral da FAO, José Graziano, as causas da fome de 29,5 milhões de pessoas na América Latina não estão na falta de alimentos, mas porque parte da população não tem acesso a eles. "Na América Latina, há uma disponibilidade de alimentos como não existe em nenhuma outra parte do mundo”, destaca Graziano. Segundo ele, o problema no continente é a distribuição da riqueza e o emprego precário. "Porque os salários são muito baixos devido ao excedente de mão de obra”, acrescenta.

(com informações da Fundação Avina)

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Na iminência de mais uma execução na Indonésia, Brasil se omite na ONU

DIREITOS HUMANOS
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Marcela Belchior
Adital
Na iminência da execução de mais um brasileiro na Indonésia condenado por tráfico de drogas, 
o Brasil se omitiu durante um dos espaços mais importantes de discussão da pena de morte no mundo. Durante o painel sobre o tema, na 28ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), o assunto não foi sequer mencionado no discurso da embaixadora brasileira na ONU, Regina Maria Dunlop, nesta quarta-feira, 04 de março, em 
Genebra, capital da Suíça e sede da entidade.
Ocupando um espaço importante na agenda externa brasileira, a expectativa era de que o país utilizasse a oportunidade para reforçar a pressão internacional contra a pena de morte no mundo, especialmente num momento em que o governo da presidenta Dilma Rousseff [Partido dos Trabalhadores – PT] tenta que o presidente indonésio, Joko Widodo, retire o brasileiro Rodrigo Gularte, condenado por tráfico de drogas, em 2005, do corredor da morte. Caso contrário, ele
será o segundo brasileiro executado pelo governo indonésio em 2015 — o primeiro foi Marco
Archer Cardoso Moreira, também condenado por tráfico, fuzilado em janeiro deste ano.
Os casos têm gerado tensões diplomáticas entre os dois países.























Condenados por tráfico de drogas na Indonésia: Rodrigo Gularte (à esquerda) deve ser executado em 2015 e Marco Archer Cardoso Moreira foi fuzilado em janeiro deste ano. Foto: reprodução.


Acompanhando o caso, a organização internacional de direitos humanos Conectas destaca que esperava-se que a diplomacia fosse incisiva nas críticas durante o discurso. No entanto, o Brasil ignorou o debate. Para a organização, a falta de contundência do discurso brasileiro contrastou com o tom adotado por países como a Argentina, que mencionou seus esforços para reverter a pena de um cidadão argentino que aguarda execução nos Estados Unidos.

"Dado o envolvimento direto da presidenta Dilma no tema, inclusive com pedidos pessoais de clemência, esperava-se que a diplomacia brasileira fosse firme em suas críticas”, afirma Camila Asano, coordenadora de Política Externa da Conectas. "O Brasil perdeu uma oportunidade única de mostrar coerência e pressionar a Indonésia internacionalmente. Seu discurso foi vazio e desconectado da realidade”, acrescenta.

"Além de genérico, o discurso do Brasil provou que não há qualquer intenção, por parte do governo, de fazer a lição de casa”, afirma Camila. "É no mínimo incoerente defender a abolição da pena de morte diante da ONU sem que isso seja seguido, no âmbito interno, por iniciativas para eliminar do ordenamento jurídico brasileiro essa pena, que é uma afronta aos direitos humanos”, complementa a coordenadora.

Embaixadora do Brasil na ONU, Regina Maria Dunlop, não mencionou caso da Indonésia em discurso. Foto: UNPhoto.


A Indonésia, por sua vez, se manifestou sobre a questão durante o painel, defendendo abertamente a pena de morte. "Essa questão é um componente inalienável da soberania legal de um país. Serve como importante impeditivo contra os crimes considerados mais sérios por nossa sociedade”, afirmou seu representante, na ocasião. "Se reintroduzimos a pena de morte é simplesmente porque somos guiados pelo agravamento da situação que afeta a nossa sociedade como resultado desses crimes”, defendeu o indonésio.

Repercussão conservadora no Brasil
Indagada sobre os setores conservadores no Brasil que defendem a execução como pena judicial, Camila Asano opina que é preciso mais informações sobre o que é a pena de morte e seus efeitos. "Esta é uma violação de direitos humanos. Se quisermos uma sociedade de direitos, isso é uma afronta”, afirma em entrevista à Adital. "Isso mostra muito o desconhecimento das pessoas que defendem. É muito um sentimento de ódio e vingança que se disfarça de justiça”, acrescenta.

Também nesse sentido, Camila argumenta que não existe comprovação empírica de que haja relação entre pena de morte e controle efetivo de crimes, e que é preciso debater o tema com mais seriedade no Brasil. "A própria Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados tem que problematizar e mostrar o retrocesso que seria a pena de morte no Brasil. (...) Os espaços de direitos humanos não estão sendo usados para isso”, exemplifica a coordenadora.



Camila Asano ressalta que pena de morte não garante controle de crimes. Foto: Conectas.


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Marcela Belchior

É jornalista da Adital. Mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), estuda as relações culturais na América Latina.
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Violência: Estados repressores estão na base do contexto de insegurança

Por Marcela Belchior da Adital


A organização de direitos humanos Anistia Internacional lançou, recentemente, um relatório que aponta que, no ano de 2014, a América Latina sentiu, profundamente, um aumento da insegurança e conflitos com a violência.

Esse contexto se agudiza, especialmente, nas circunstâncias de vulnerabilidade das populações da região às redes criminosas, que envolvem, na maioria das vezes, a participação ativa de agentes públicos do Estado, que deveriam zelar pelos direitos dos latino-americanos.

Para interpretar esse contexto, a Adital entrevistou, com exclusividade, o cientista político e assessor de Direitos Humanos da Anistia Internacional Brasil, Maurício Santoro. Ele explica que pontos comuns entre as nações do continente — como a segurança pública militarizada, as instituições policiais marcadas pela falta de transparência, impunidade e repressão seletiva a minorias — são algumas razões para a construção desse cenário.

Outro grave problema cada vez mais presente na região é a repressão ao ativismo de direitos humanos, manifestada especialmente na perseguição a militantes envolvidos na defesa dos recursos naturais da América Latina, minorias étnicas e sexuais. Nesse contexto, os Estados figuram como repressores das iniciativas populares, erodindo o espaço democrático na América Latina.

Por outro lado, Santoro aponta que os movimentos por direitos humanos na região têm conquistado cada vez mais sofisticação e organização, e galgado maior presença nas instituições públicas, uma conquista recente que tem levado cada vez mais gente às ruas. Confira a entrevista:

ADITAL - O recente relatório, lançado pela Anistia Internacional, aponta que, no ano de 2014, houve aumento da insegurança, de conflitos com violência e da repressão institucional, em muitos países da América Latina, entre eles Brasil, Venezuela e México. Que causas podemos observar nesse contexto de uso multilateral da violência e da falta de segurança na região?

Maurício Santoro - Há várias razões, com pesos diferentes para cada país, mas um dos pontos comuns é um modelo de segurança pública militarizado, baseado no enfoque da "guerra às drogas”, com consequências muito negativas para os direitos humanos. As polícias latino-americanas são, em geral, instituições marcadas pela falta de transparência, impunidade e por diversos episódios com a população mais pobre, sobretudo as de origem negra ou indígena. A região também se destaca por um alto número de homicídios, dos quais poucos são investigados a fundo, com a punição dos responsáveis. Outro problema conjunto é um quadro de perseguição e violência contra ativistas de direitos humanos, em particular aqueles cuja militância se dá em situações de conflitos por recursos naturais — terra, mineração — ou da proteção de minorias étnicas e sexuais (ver penúltima pergunta).

ADITAL - O Estado é apontado como repressor das iniciativas populares. Como esse papel vem sendo desenrolado nos países latino-americanos? A democracia vem sofrendo com Estados truculentos na região?

MS - Há uma preocupante erosão do espaço democrático na América Latina, impulsionada pela repressão dos Estados a protestos e com tentativas de criminalizar movimentos sociais e ativistas de direitos humanos.

ADITAL - Além desse papel do Estado, como ele colabora para a projeção e manutenção de um contexto de insegurança e violência?

MS - As políticas de segurança pública na região, com frequência, pioram a situação dos direitos humanos, com a persistência de prisões arbitrárias, torturas, assassinatos e desparecimentos forçados, cometidos por policiais e militares, em contexto de grande impunidade. A abordagem de guerra às drogas leva a violações contra setores mais pobres e discriminados da população, tratados como suspeitos pelas autoridades, como ocorre com moradores de favelas e bairros de periferia.

No período da Copa do Mundo no Brasil, em 2014, o Estado se utilizou da violência física e política para cercear protestos da população. Foto: Reprodução.

ADITAL - Para não cairmos na generalização da América Latina, podemos apontar onde essas circunstâncias podem ser mais observadas?

MS - A Anistia Internacional não elabora rankings de direitos humanos, sobre quais países estão, supostamente, melhores ou piores na comparação uns com os outros. Preferimos trabalhar com casos individuais expressivos. Nesse sentido, podemos apontar exemplos ilustrativos dos dramas de direitos humanos na América Latina: o desaparecimento dos 43 estudantes na cidade de Iguala, no México; a persistência do longo conflito armado na Colômbia, com seus terríveis impactos para a população civil; diversas chacinas (Complexo da Maré [Rio de Janeiro], Belém do Pará, Cabula [Salvador, Bahia]) no Brasil; a perseguição a líderes da oposição na Venezuela; as consequências da proibição total do aborto em El Salvador e Nicarágua.

ADITAL - Ainda assim, podemos dizer que os movimentos sociais em defesa dos direitos humanos estão mais organizados?

MS - Na comparação com o período autoritário, impressiona o nível de desenvolvimento e sofisticação dos movimentos por direitos humanos na América Latina; em grande medida, uma conquista recente, desde a redemocratização da região iniciada em meados da década de 1980.

ADITAL - A população da região está mais nas ruas?

MS - Sim. Nos últimos anos, vimos grandes manifestações em países como Argentina, Brasil, México e Venezuela, entre outros. Infelizmente, com frequência, esses protestos têm sido reprimidos de maneira brutal pelas forças de segurança, numa perigosa erosão das liberdades democráticas.

ADITAL - A discussão sobre a defesa dos direitos humanos está mais presente tanto nas instituições públicas quando na sociedade civil?

MS - Em grande medida. Muitos países da América Latina, hoje, têm Constituições que dão grande espaço para direitos humanos, as leis sobre o tema foram aprimoradas e instituições oficiais criadas para lidarem com algumas das demandas com respeito aos direitos. Contudo, há diversos pontos que permanecem muito frágeis, como a legislação sobre direitos sexuais e reprodutivos — o tratamento do aborto, homofobia etc. Em muitas nações da região, os crimes das ditaduras seguem impunes. Alguns líderes políticos incitam a população contra direitos humanos, instigam discriminação contra minorias e tentam passar leis que cerceiam os DH.

População mexicana tem ido às ruas exigir solução para o desaparecimento de 43 estudantes na cidade de Iguala. Foto: Giulia Iacolutti.


ADITAL - Quais direitos humanos são mais violados na região? Podemos apontar o contexto político-econômico que provoca essas violações?

MS - Em nosso relatório, listamos uma série de casos de violações de direitos humanos na América Latina, tais como situações de violência policial, repressões a protestos, criminalização do aborto, perseguições a defensores de DH, restrições à liberdade de expressão, discriminação contra negros e indígenas, agressões a ativistas LGBT [Lésbicas Gays, Bissexuais e Transexuais]. Essas violências foram mantidas mesmo no contexto do expressivo crescimento econômico e redução de pobreza na região, ao longo dos últimos anos.

ADITAL - Movimentos sociais, defensoras e defensores dos direitos humanos e comunicadores são alvos frequentes da repressão institucional, seja do Estado, seja da iniciativa privada. Esse contexto ainda é silenciado para o restante da população?

MS - Há muitas tentativas de calar os defensores de direitos humanos na América Latina ou cercear sua ação junto à sociedade. Esses ataques vão desde condenações ao seu trabalho em declarações de autoridades (pretendendo, assim, deslegitimá-los perante a opinião pública) até atos de intimidação, ameaças e violências. Crimes contra eles raramente são investigados e punidos.

ADITAL - Como os movimentos sociais em defesa dos direitos humanos devem se portar diante de tais circunstâncias?

MS - Nosso trabalho é no sentido de cobrar o respeito pelos direitos humanos por parte do Estado. Acreditamos que cada movimento social deve optar pelos caminhos que julgarem melhores.

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Marcela Belchior

É jornalista da Adital. Mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), estuda as relações culturais na América Latina.
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Exposição: A mulher no século 21 - direitos e conquistas

Adital

O Senac [Serviço Nacional do Comércio) de Campinas [Estado de São Paulo, recebe, de 09 a 28 de março, a exposição "A mulher no século 21 - direitos e conquistas”.

A mostra é resultado do 4º Concurso de Fotografia, realizado pela ONG SOS Ação Mulher e Família, em parceria com o Núcleo de Fotografia de Campinas.

Essa exposição retrata a essência e a realidade da consolidação dos direitos humanos, sobretudo das mulheres, resultado das lutas feministas, entrelaçadas e efetivadas sobre as leis atuais, práticas cotidianas e políticas públicas.

O concurso foi aberto a fotógrafos amadores e profissionais, brasileiros e estrangeiros. A mostra traz 30 fotos selecionadas por membros da SOS Ação Mulher e Família e do Núcleo de Fotografia de Campinas.

Simultaneamente, o Senac Osasco também em São Paulo, também fará uma exposição das 30 fotos selecionadas no 4º Concurso de Fotografia realizado pelo SOS Ação Mulher e Família e Núcleo de Fotografia de Campinas.


Depois da democracia, uma ditadura conservadora pós-apocalíptica

Por Leonardo Sakamoto*

Um experiente parlamentar do PSDB me disse, nesta terça (3), que, se nada for feito, ao final dessa guerra nuclear política, vão sobrar apenas baratas em uma ditadura conservadora pós-apocalíptica. 

Pois os dois partidos que eram a maior esperança do país e em torno do qual a democracia brasileira se consolidou nos últimos 20 anos, vão garantir que ocorra Destruição Mútua Assegurada. Segundo essa doutrina militar, conhecida por quem viveu o horror da Guerra Fria, como cada um dos lados (EUA e União Soviética) tinha armamentos nucleares suficientes para destruir o outro e que, uma vez atacado, retaliaria com força igual ou maior, a escalada resultante levaria ao fim de ambos. E talvez do mundo como o conhecíamos. Esse medo também levou o outro lado a, sabendo disso, evitar ao máximo começar um ataque. Um equilíbrio tenso mas, ainda assim equilíbrio.

 Para o parlamentar, essa ponderação – de que o final de uma escalada de ataques sujos e rasteiros virtuais e analógicos colocará em cheque a utilidade das instituições democráticas – não está sendo feita. É o vale-tudo. Ele reconhece que a classe política é a responsável pela situação a que chegamos, com toda a corrupção, incompetência e ignorância que minou a credibilidade de instituições.

Mensalões, Trensalões, Lavas-Jato e a maioria dos escândalos, que permanece longe dos olhos do grande público. Mas atacar a democracia, é jogar fora a criança com a água suja do banho. Pois é apenas em um ambiente democrático que a democracia consegue mudar seus próprios rumos e corrigir-se. O parlamentar, em questão, está horrorizado com tantas mensagens que vem recebendo, exigindo o fechamento do Congresso. Pessoas decretando a inutilidade não só do parlamento, mas também da própria atividade política – que, teoricamente, deveria ser uma das mais nobres práticas humanas. Outros solicitam que se encontre um “salvador da pátria” que nos tire das trevas, sem o empecilho de pesos e contrapesos. Ou que Jesus volte.

Pessoas que, em sua maioria, são muito jovens para ter ideia do que estão falando porque não viveram a desgraça da ditadura. Ou, em sua minoria, que sabem muito bem do que estão falando e querem, patologicamente, essa desgraça de volta.

Nesse contexto, o parlamentar reclamou que qualquer pessoa com posicionamento político tem sido criticada pesadamente. Ter opinião virou crime, defender um ponto de vista agora é delito, abraçar uma ideologia é passível de morte. Ou, nas suas palavras, “fazer política se tornou escroto”. Ou, pior, caminho para o enriquecimento ilícito. Ou seja, espalha-se a percepção de que quem se engaja na política, partidária ou não (porque muitos fazem questão de resumir toda política à partidária), tem interesses financeiros.

Porque muita gente não consegue entender que a vontade de participar dos desígnios da pólis não seja apenas por ganho pessoal. O parlamento deveria ser o centro da vida política do país e não um estábulo de interesses pessoais.

Mas a roda-viva da terra arrasada agora gira por conta própria. O problema é que, segundo ele, alguns grupos que vivem à sombra dos partidos, de um lado e de outro, se alimentam desse processo. Eles não querem diálogo, querem sangue.

Quanto pior, melhor. Para ele, os partidos acham que estão reunindo as forças ao seu lado para a guerra. O problema é que, ao final, não vai sobrar partido para contar história. Se é que eles ainda existem.

Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política. Cobriu conflitos armados e o desrespeito aos direitos humanos em Timor Leste, Angola e no Paquistão. Professor de Jornalismo na PUC-SP, é coordenador da ONG Repórter Brasil e conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão.

Confira a lista de políticos que serão investigados pela Operação Lava-Jato. Cinco são de Pernambuco



A lista de políticos que serão investigados por suposto envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras foi divulgada na noite desta sexta-feira (6) depois de muita ansiedade no meio político. Entre os nomes citados, estão cinco pernambucanos: o senador Humberto Costa (PT), o deputado federal Eduardo da Fonte (PP), além dos ex-deputados federais Pedro Corrêa (PP), de sua filha, Aline Corrêa (que também é ex-deputada federal do PP, mas pelo estado de São Paulo), além de Roberto Teixeira (PP), que perdeu a disputa pela reeleição no ano passado.

A divulgação dos nomes mais uma vez coloca o ex-deputado Pedro Corrêa, que presidiu nacionalmente o PP, no centro das denúncias. Além dele, sua filha e seu ex-genro, Roberto Teixeira, são citados. Pedro Corrêa atualmente cumpre pena na penitenciária de Canhotinho, no Agreste do estado, por envolvimento no esquema do Mensalão. Ele inclusive só aguarda uma decisão do Supremo Tribunal Federal para sair da prisão, porque já cumpriu um terço da pena em regime semi-aberto. É importante ressaltar, no entanto, que os nomes citados ainda não são réus. Eles ainda têm o direito de defesa.

Confira a lista abaixo:

Senador Ciro Nogueira (PI)
Senador Benedito de Lira (AL)
Senador Gladson Cameli (AC)
Deputado Aguinaldo Ribeiro (PB)
Deputado Simão Sessim (RJ)
Deputado Nelson Meurer (PR)
Deputado Eduardo da Fonte (PE)
Deputado Luiz Fernando Faria (MG)
Deputado Arthur Lira (AL)
Deputado Dilceu Sperafico (PR)
Deputado Jeronimo Goergen (RS)
Deputado Sandes Júnior (GO)
Deputado Afonso Hamm (RS)
Deputado Missionário José Olímpio (SP)
Deputado Lázaro Botelho (TO)
Deputado Luis Carlos Heinze (RS)
Deputado Renato Molling (RS)
Deputado Renato Balestra (GO)
Deputado Lázaro Britto (BA)
Deputado Waldir Maranhão (MA)
Deputado José Otávio Germano (RS)
Ex-deputado e ex-ministro Mario Negromonte (BA)
Ex-deputado João Pizzolatti (SC)
Ex-deputado Pedro Corrêa (PE)
Ex-deputado Roberto Teixeira (PE)
Ex-deputada Aline Corrêa (SP)
Ex-deputado Carlos Magno (RO)
Ex-deputado e ex-vice governador João Leão (BA)
Ex-deputado Luiz Argôlo (BA)
Ex-deputado José Linhares (CE)
Ex-deputado Pedro Henry (MT)
Ex-deputado Vilson Covatti (RS)
Senadora Gleisi Hoffmann (PR)
Senador Humberto Costa (PE)
Senador Lindbergh Farias (RJ)
Deputado José Mentor (SP)
Deputado Vander Loubet (MS)
Ex-deputado Cândido Vaccarezza (SP)
Senador Renan Calheiros (AL), presidente do Senado
Senador Romero Jucá (RR)
Senador Edison Lobão (MA)
Senador Valdir Raupp (RO)
Deputado Eduardo Cunha (RJ), presidente da Câmara
Deputado Aníbal Gomes (CE)
Senador Fernando Collor (AL)
Roseana Sarney (MA)
Senador Antonio Anastasia (MG)

Fonte: Diario de Pernambuco