Por Leonardo Sakamoto*
Um experiente parlamentar do PSDB me disse, nesta terça (3), que, se nada for feito, ao final dessa guerra nuclear política, vão sobrar apenas baratas em uma ditadura conservadora pós-apocalíptica.
Pois os dois partidos que eram a maior esperança do país e em torno do qual a democracia brasileira se consolidou nos últimos 20 anos, vão garantir que ocorra Destruição Mútua Assegurada.
Segundo essa doutrina militar, conhecida por quem viveu o horror da Guerra Fria, como cada um dos lados (EUA e União Soviética) tinha armamentos nucleares suficientes para destruir o outro e que, uma vez atacado, retaliaria com força igual ou maior, a escalada resultante levaria ao fim de ambos. E talvez do mundo como o conhecíamos. Esse medo também levou o outro lado a, sabendo disso, evitar ao máximo começar um ataque. Um equilíbrio tenso mas, ainda assim equilíbrio.
Para o parlamentar, essa ponderação – de que o final de uma escalada de ataques sujos e rasteiros virtuais e analógicos colocará em cheque a utilidade das instituições democráticas – não está sendo feita. É o vale-tudo.
Ele reconhece que a classe política é a responsável pela situação a que chegamos, com toda a corrupção, incompetência e ignorância que minou a credibilidade de instituições.
Mensalões, Trensalões, Lavas-Jato e a maioria dos escândalos, que permanece longe dos olhos do grande público.
Mas atacar a democracia, é jogar fora a criança com a água suja do banho. Pois é apenas em um ambiente democrático que a democracia consegue mudar seus próprios rumos e corrigir-se.
O parlamentar, em questão, está horrorizado com tantas mensagens que vem recebendo, exigindo o fechamento do Congresso. Pessoas decretando a inutilidade não só do parlamento, mas também da própria atividade política – que, teoricamente, deveria ser uma das mais nobres práticas humanas. Outros solicitam que se encontre um “salvador da pátria” que nos tire das trevas, sem o empecilho de pesos e contrapesos. Ou que Jesus volte.
Pessoas que, em sua maioria, são muito jovens para ter ideia do que estão falando porque não viveram a desgraça da ditadura. Ou, em sua minoria, que sabem muito bem do que estão falando e querem, patologicamente, essa desgraça de volta.
Nesse contexto, o parlamentar reclamou que qualquer pessoa com posicionamento político tem sido criticada pesadamente. Ter opinião virou crime, defender um ponto de vista agora é delito, abraçar uma ideologia é passível de morte. Ou, nas suas palavras, “fazer política se tornou escroto”.
Ou, pior, caminho para o enriquecimento ilícito. Ou seja, espalha-se a percepção de que quem se engaja na política, partidária ou não (porque muitos fazem questão de resumir toda política à partidária), tem interesses financeiros.
Porque muita gente não consegue entender que a vontade de participar dos desígnios da pólis não seja apenas por ganho pessoal.
O parlamento deveria ser o centro da vida política do país e não um estábulo de interesses pessoais.
Mas a roda-viva da terra arrasada agora gira por conta própria.
O problema é que, segundo ele, alguns grupos que vivem à sombra dos partidos, de um lado e de outro, se alimentam desse processo. Eles não querem diálogo, querem sangue.
Quanto pior, melhor.
Para ele, os partidos acham que estão reunindo as forças ao seu lado para a guerra. O problema é que, ao final, não vai sobrar partido para contar história.
Se é que eles ainda existem.
Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política. Cobriu conflitos armados e o desrespeito aos direitos humanos em Timor Leste, Angola e no Paquistão. Professor de Jornalismo na PUC-SP, é coordenador da ONG Repórter Brasil e conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão.