As linhas do tempo foram invadidas por um ronrom virótico da autoajuda e edificâncias que tais que nos chegam via 'curtir' e 'compartilhar'
Há poucos meses correu a notícia de que o fundador e CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, teria feito a seguinte declaração ao canal de notícias norte-americano CNN sobre o comportamento dos usuários do Brasil na maior e mais famosa rede social do planeta: “Se por um lado, os brasileiros fazem o Facebook crescer, por outro estragam tudo”.
A notícia era falsa, mas vejam como a redação da “matéria” soou tão factível que enganou muita gente: “Os engenheiros do Facebook estavam pensando em permitir a inserção de imagens no formato gifs animados (imagens com movimento), mas Mark impediu a ideia por causa do Brasil. Segundo Mark, se o Facebook abrir espaço para os gifs, o compartilhamento entre os usuários brasileiros ficará igual ao Orkut, cheio de letrinhas coloridas, se mexendo, com mensagens de carinho e amor”.Quem usa diariamente o Facebook, e o usa em português, sabe muito bem: as linhas do tempo foram invadidas por frases pretensamente inteligentes, mas de lógicas duvidosas, lugares comuns postados como se fossem descobertas da pólvora, e — as campeãs — mensagens motivacionais, como se a própria rede social tivesse se transformado em um grande e virtual guru de autoajuda, isso sem contar as fotos escatológicas, de animais mutilados e constrangedoras confissões públicas de problemas pessoais.
Algumas das pérolas mais famosas
Umas das mensagens motivacionais mais compartilhadas e “curtidas” no Facebook mostra a imagem da silhueta de uma pessoa escalando um rochedo à beira mar e tendo como pano de fundo o sol ao horizonte. A mensagem exorta ao otimismo: “se você tem 1% de chance, tenha 99% de fé”.
Crítico ao culto da autoajuda, o blog Auto Atrapalha (http://www.autoatrapalha.com.br) observou com perspicácia: “Este é o tipo de mensagem que deveria ter um aviso do Ministério da Saúde. 99% de chances de morrer é maior do que qualquer cigarro, bebida ou os dois juntos!”.
Uma outra mensagem, essa de cunho ativista, diz que se o usuário do Facebook “é contra a violência doméstica e QUALQUER tipo de desrespeito as (sic) mulheres”, então ele tem que compartilhar uma mensagem que, entre outras advertências, faz esta, cujo autor talvez mal tenha notado o machismo implícito na maneira como se diz que uma mulher mal tratada é enxergada:
“Enquanto você a machuca, há um homem pensando que poderia fazer amor com ela”.
‘Eu queria morar no Facebook’
Uma outra mensagem, que começou a circular recentemente no Facebook, ironiza o bom-mocismo-atuante-feliz-e-pseudo-intelectualizado que corre e impera nas linhas do tempo afora:
“Queria morar no Facebook, aqui todo mundo é do bem, ama os animais, todo mundo odeia os falsos, todo mundo é amigo, odeia corrupção, é fiel, prefere namorar do que sair, tem a família perfeita, só tem momentos felizes e gosta das pessoas pelo caráter e inteligência e não pela beleza exterior ou pelos bens materiais”.
Isso mostra que, como em tudo na via, também em meio à pieguice, ao politicamente correto e às maçantes correntes pra frente que inundaram o Facebook, em particular, e a internet em geral, há o outro lado da moeda, cunhado por quem consegue fugir um pouco do ronrom virótico da autoajuda e edificâncias que tais via “curtir” e “compartilhar”.
(Por Hugo Souza - Opinião e Política)